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segunda-feira, 29 de agosto de 2016

O que pode fazer o cidadão caso fique vários dias sem receber água?!



Inúmeras são as comunidades brasileiras que sofrem com a precariedade do serviço de abastecimento hídrico a ponto das pessoas não terem nem uma gota d'água na torneira para lavar as mãos. E, neste mês de agosto, alguns bairros daqui de Mangaratiba estão passando por isso a exemplo do Centro, Praia do Saco, Nova Mangaratiba e Parque Bela Vista. Há tempos que os políticos prometem resolver a situação, mas não cumprem.

Entretanto, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 22, proíbe expressamente que haja suspensão de um serviço considerado essencial tal como ocorre com o abastecimento de água e a distribuição de energia elétrica, prevendo uma solução no seu parágrafo único. Diz a lei o seguinte:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

Na data de hoje (29/08), a revolta da população local explodiu e pessoas foram às ruas protestar contra o permanente descaso da Cedae que é a empresa estadual responsável pela execução dos serviços de saneamento básico aqui na cidade. Nada contra o direito de manifestação pacífica. Porém, é importante o cidadão não deixar de fazer uso também da via judicial movendo a sua ação em face dessa companhia omissa visto que as autoridades não tomam as providências cabíveis.




Em termos práticos, diante de um problema assim, seriam dois os requerimentos principais que podemos formular numa ação judicial. Um deles seria o pedido obrigacional a fim de que a empresa ou a entidade pública responsável pelo abastecimento de água dê o seu jeito para fornecer o serviço ao cidadão que tenha suas contas anteriores pagas em dia. Neste caso, devido à urgência e à essencialidade do serviço, torna-se cabível peticionar ao juiz que, antes do julgamento, determine a execução forçada da obrigação, estabelecendo uma pena pecuniária para a hipótese de descumprimento de sua decisão.

Já o outro pedido seria a reparação dos danos causados. Ou seja, o consumidor vai requerer indenização pelas perdas materiais e/ou morais que sofreu em decorrência da falta d'água. Se, por exemplo, ele precisou pagar por um caminhão pipa para encher o seu reservatório, poderá cobrar o reembolso desse dinheiro (apresentando recibo) que só precisou gastar porque o serviço da concessionária ou da entidade pública falhou. Ou melhor, poderá cobrar o ressarcimento da diferença entre a tarifa oficial e o valor pago ao fornecedor privado porque a indenização integral equivaleria à gratuidade da água no período.

Independentemente do problema ter já cessado, ou do usuário não chegar a desembolsar quantia alguma com carro pipa ou galões de água mineral, só o constrangimento de ficar vários dias sem o serviço é capaz de gerar dano moral. E, neste caso, nem precisa ser o titular da conta de água e menos ainda o proprietário. Basta provar que vive no imóvel atendido pela empresa e que ocorreu a falta d'água afetando a residência.

O valor da indenização pelos danos morais pode variar conforme a avaliação de cada situação e de acordo com o entendimento do juiz pois cada magistrado tem a sua própria convicção jurídica. A legislação brasileira não diz qual deve ser o valor exato da quantia a ser fixada, sendo aconselhável ao advogado do consumidor basear-se nos parâmetros da jurisprudência do Tribunal ou do Conselho Recursal julgador para não requerer algo desproporcional.

Infelizmente, a Justiça brasileira não costuma arbitrar indenizações por dano moral que, a meu ver, seriam de fato proporcionais para compensar o cidadão por esses gritante abusos. Porém, tais sentenças já servem de desestímulo para a conduta abusiva das empresas de saneamento. Há uns três/quatro anos atrás, os moradores de Maricá (RJ) que procuraram se socorrer pelo Juizado Especial Cível conseguiram receber R$ 5 mil de indenização da Cedae por terem ficado meses sem fornecimento de água, conforme foi fixado pela 4ª Turma Recursal. E, além da reparação, o colegiado de segunda instância, formado pelos juízes Flávio Citro, Eduarda Monteiro e Claudia Cardoso, também determinou que a empresa forneça água por meio de carro-pipa a cada 15 dias ao morador. Aliás, vale a pena citar um trecho do que decidiu a magistrada local do Juízo de Maricá, Dra. Criscia Curty de Freitas Lopes, segundo foi reproduzido numa matéria publicada no jornal O GLOBO de 2013:

"O fornecimento de água é considerado um serviço público essencial, na forma do artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), devendo ser prestado de forma contínua aos consumidores. Diante de tal assertiva, não há razão para que o réu (a Cedae) deixe de abastecer a residência do autor, pois mesmo que houvesse alguma estiagem de água no município, como alegado, existem outros meios, como, por exemplo, fornecimento de carros-pipa, para satisfazer a necessidade dos usuários" (extraído de http://oglobo.globo.com/economia/defesa-do-consumidor/justica-determina-indenizacao-de-5-mil-por-falta-de-agua-consumidor-de-marica-7755501)

Tal como Maricá, Mangaratiba sobre com situações idênticas. O nosso problema de abastecimento de água ocorre principalmente no período de verão, tendo em vista o aumento da população na alta temporada e acontece também durante o período da estiagem. Porém, como já existe um precedente na Justiça do Estado do Rio de Janeiro, a população de vários outros municípios fluminenses pode seguir pelo mesmo caminho entrando com processo.

Paralelamente, é possível ainda requerer ao Ministério Público que tome as devidas providências. O caminho seria provocar a atuação da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa do Consumidor e do Contribuinte que, no caso de Mangaratiba, fica em Angra dos Reis. Pois se trata do órgão competente para ajuizar a ação civil pública contra a fornecedora de água por precariedade no abastecimento a moradores. Ao receber as representações destes, o Ministério Público instaura procedimentos como o inquérito civil e busca apurar os fatos para então requerer uma providência do Judiciário em favor da coletividade (não de um consumidor específico). 

Como a atuação do Ministério Público é mais lenta (e não pode o promotor pretender a reparação dos prejuízos sofridos por um cidadão específico), é aconselhável que as pessoas lesadas ingressem com suas respectivas ações na Justiça pedindo indenização por danos morai pela falta d'águas. E isso pode ser feito através do Juizado Especial Cível cujo processo, além de ser mais célere, tem as custas suspensas na tramitação de primeira instância. Só na hipótese de interpor recurso contra a sentença é que o recorrente terá que pagar pelas despesas processuais, se não vier a conseguir o benefício da gratuidade de justiça.

Enfim, essa é a minha sugestão. E para melhor informar o consumidor daqui de Mangaratiba deixo a seguir os contatos da Justiça e do Ministério Público, recomendando a contratação de um advogado para o caso de alguém ingressar com ação judicial (ou a Defensoria Publica):

Fórum da Comarca de Mangaratiba: Estrada de São João Marcos, S/Nº - Bairro El Ranchito (ao lado da Delegacia) - Mangaratiba
Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Angra dos Reis (com competência territorial sobre Mangaratiba, Itaguaí, Angra e Paraty): Rua Cel. Carvalho, n.º 485, Centro - Angra dos Reis.

Para o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, além dos endereços físicos das promotorias, pode o cidadão fazer contato inicial via Ouvidoria ligando para o telefone 127 ou no site da instituição na internet (clique AQUI para acessar o formulário eletrônico)

Vamos à luta!


OBS: Fotos acima compartilhadas por diversas pessoas da cidade nas redes sociais na presente data.

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