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sexta-feira, 14 de maio de 2010

Mesmo quando a nossa pequena fé enfraquece, Deus nos sustenta

Acho fantástica aquela passagem do Evangelhos de Mateus em que Jesus anda sobre as águas. Não digo isto por causa do evento milagroso em as leis da gravidade foram contrariadas, mas sim pelo que aconteceu com Pedro naquela ocasião.

Segundo o texto bíblico, após Jesus ter despedido as multidões, no episódio da primeira multiplicação dos pães, ele subiu a um monte para orar sozinho (passar momentos a sós com Deus fazia parte da vida de Jesus). Então, antes disto, o Senhor mandou que os discípulos entrassem no barco e fossem para o outro lado do Mar da Galileia. E, na “quarta vigília da noite” (suponho que em algum momento entre 3 e 6 horas da manhã), os discípulos ficaram assustados quando viram o Senhor andando sobre as águas:

“E os discípulos, ao verem-no andando sobre as águas, ficaram aterrados e exclamaram: É um fantasma! E, tomados de medo, gritaram. Mas Jesus imediatamente lhes disse: Tende bom ânimo! Sou eu. Não temais! Respondendo-lhe Pedro, disse: Se és tu, Senhor, manda-me ir contigo, por sobre as águas. E ele disse: Vem! E Pedro, descendo do barco, andou por sobre as águas e foi ter com Jesus. Reparando, porém, na força do vento, teve medo; e, começando a submergir, gritou: Salva-me, Senhor! E, prontamente, Jesus, estendendo a mão, tomou-o e lhe disse: Homem de pequena fé, por que duvidaste? Subindo ambos para o barco, cessou o vento.” (Mateus 14:26-32)

Embora esta passagem esteja também registrada nos Evangelhos de Marcos (6:45-52) e de João (6:15-21), apenas em Mateus encontramos informações sobre o que aconteceu com Pedro naquele angustiante momento de dúvida e de medo. E acredito que sempre há algum significado profundo a ser pesquisado e refletido em qualquer acontecimento relatado pela Bíblia, assim como ocorre em todas as situações da nossa vida.

Primeiramente desperta-me a curiosidade por que Pedro, após ver Jesus andando sobre as águas teve dúvidas a respeito da pessoa de Jesus? Será que o apóstolo. assim como os demais discípulos que estavam no barco, pensou que se tratasse da aparição de um fantasma, ou ele queria apenas confirmar a sua fé através da resposta de Jesus?

Suponho que Pedro já conhecesse um pouco da personalidade do Mestre, pois confiava o suficiente na acessibilidade de Jesus para distinguir a resposta dada pelo Senhor do que poderia lhe diria um fantasma. E, se ele tinha tamanha confiança, foi porque não se calou, tendo a ousadia de perguntar “se és tu, manda-me ir ter contigo”.

Pedro demonstrou tamanha fé que, depois de sua ousada pergunta, tendo Jesus lhe respondido para que viesse ao seu encontro, o discípulo colocou seus dois pés sobre as águas do Mar da Galileia desafiando não apenas o medo irreal de fantasmas (coisa até hoje muito comum nas comunidades rurais), como também desafiou as leis da física já que, naquele grande mar de água doce, pelo menos parte do seu corpo iria imediatamente submergir tão logo saísse do barco.

Só que, num curto espaço de tempo, depois de ter demonstrado fé, Pedro também sentiu sua confiança abalada quando reparou na força do vento e ficou com medo. Naquele instante, em que a sua atenção voltou-se para o mal tempo e não para o Senhor Jesus, o discípulo começou a afundar nas águas.

Mais uma vez, Pedro precisou ter fé quando pediu a Jesus que o salvasse. Naquele momento, Pedro demonstrou sua confiança quando pediu ajuda mesmo quando estava afundando.

Mas Jesus não tinha confirmado a pergunta de Pedro para que se encontrasse com ele caminhando sobre as águas? Sendo assim, Pedro não poderia ter alimentado inúmeros pensamentos equivocados em sua mente, achando, por exemplo, que não teria sido Jesus quem lhe mandou caminhar sobre as águas do mar e sim um fantasma. Felizmente, ele decidiu crer novamente e pedir socorro.

Não muito diferente de Pedro, por diversas vezes, vejo a mim mesmo precisando manter fé em meio às dúvidas e às tempestades que a vida trás. Tratam-se de ocasiões em que as coisas não fluem do jeito que gostaríamos, mas assim mesmo decidimos confiar em Deus e lhe obedecer, gritando pelo seu socorro se necessário for.

Acredito que a fé está intimamente ligada à decisão que cada um de nós tomamos, algo que vai além dos termos convicção e certeza utilizados nas nossas traduções bíblicas para o português do primeiro verso do capítulo 11 de Hebreus, no Novo testamento. Ali o autor anônimo da epístola define fé da seguinte maneira, articulando-a com os atos praticados por personagens do Antigo Testamento:

“Ora, a fé é a certeza (gr. hupostasis, lit. “o que está debaixo”) de coisas que se esperam, a convicção (gr. elenchos, lit. “prova”) de fatos que se não vêem. Pois, pela fé, os antigos obtiveram bom testemunho. Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem.” (Hebreus 11:1-3)

Refletindo sobre essas palavras, podemos dizer que a fé (ou o ato de crer) relaciona-se intimamente com a ação praticada pelo crente, em que a conduta torna-se condizente com a esperança da promessa de Deus ainda não vista pelos nossos olhos. Tanto é que não seria errado utilizar a palavra fidelidade como um sinônimo de fé, o que está de acordo com o princípio da epístola de Tiago em que “a fé sem obras é morta”.

A partir de sua definição, o autor de Hebreus cita no capítulo 11 exemplos bem extensos de fé de vários personagens bíblicos, começando por Abel. Nos versos de 8 a 19, são citadas algumas passagens relacionadas à vida de Abraão, considerado o “pai da fé”.

Quando falamos a respeito de Abraão, muitas das vezes nos esquecemos como foi dura a jornada daquele homem. Contudo, a sua experiência relacional com Deus não se construiu em cima de facilidades, sendo que todas as bençãos ocorreram num tempo pré-determinado e não no nosso próprio cronograma. O nascimento de seu filho Isaque, por exemplo, não foi de imediato e ocorreu quando Abraão e Sara já estavam na extrema velhice.

No capítulo 12 de Gênesis, dizem as Escrituras que o SENHOR falou com Abraão, dando-lhe a ordem para sair da casa de seus parentes e se dirigi para uma terra que ainda lhe seria mostrada. Ali, Deus prometeu que de Abraão, um homem ainda sem filhos e marido de uma esposa estéril, seria feita “uma grande nação”.

Embora o texto não informe com detalhes sobre como que Deus falou com Abraão pela primeira vez (não sabemos se ele sonhou, teve uma visão sobrenatural, se escutou uma voz específica ou teve apenas um forte sentimento no seu coração), o texto de Gênesis somente diz que o patriarca obedeceu, partindo de Harã para Canaã. E, confirmando isto, o autor de Hebreus conta que ele “partiu sem saber aonde ia”.

Abraão apostou tudo o que tinha naquela jornada. Estavam em jogo todos os seus bens, a vida das pessoas que lhe acompanhavam e o futuro de sua família. Se algo desse errado, sua reputação estaria abalada, ele poderia perder parte de seu rebanho (sua fonte de sustento), passar fome, tornar-se escravo de alguém, ser assaltado ou até mesmo morto no caminho.

Observemos, porém, que Abraão chegou a uma terra prometida que ainda era habitada por um outro povo – os cananeus. Só que, ainda assim, Abraão prestou o seu culto a Deus, edificando um altar ao SENHOR logo que chegou a Canaã, o que representa demonstração de fé e submissão à vontade daquele que é o rei de todo o universo.

Tendo já encontrado a terra da qual ainda não era possuidor, Abraão foi testado por uma grande fome (imagino que devido a um período de escassez de chuvas). Mesmo sabendo que estava morando na terra da promessa, Abraão foi para o Egito, país onde a falta de água pluvial é suprima pelo majestoso rio Nilo. E, embora o texto bíblico não diga se Deus proibiu ou não Abraão de refugiar-se naquele país, parece-me que foi uma decisão tomada por conta do patriarca:

“Havia fome naquela terra; desceu, pois Abrão ao Egito, para aí ficar, porquanto era grande a fome na terra.” (Gênesis 12:10)

Enquanto que na Palestina o agricultor e o criador de gado precisam da regularidade das primeiras e das últimas chuvas do ano para desenvolverem com sucesso as suas atividades rurais, tal preocupação não existe no Egito. Lá o Nilo, tão extenso quanto o nosso Amazonas, jamais seca, permitindo que a vida resista na parte leste do deserto do Saara. As cheias sazonais do rio fertilizam as margens, propiciando a prática da agropecuária desde as mais antigas eras da humanidade. Tanto é que Heródoto, historiador grego do século V a.C. (o “pai da história”), proferiu a célebre frase: “O Egito é uma dádiva do Nilo”.

Em termos espirituais, as facilidades proporcionadas pela geografia do Egito contrapõem-se à dependência do homem em relação a Deus. Migrar para o Egito significava afastar-se da terra da promessa, contrariando o propósito estabelecido pelo SENHOR que havia dito a Abraão que ele seria uma benção.

Na sua primeira grande provação na terra de Canaã, o nosso herói da fé não somente foi ao Egito como temeu revelar a condição de Sara como sua esposa. Diz na Bíblia que Abraão temeu ser morto por causa da formosura de sua esposa, pelo que resolveu apresentá-la aos egípcios como sendo sua irmã.

Mesmo tendo Abraão migrado para o Egito, o SENHOR não o abandonou. E, quando o faraó pretendia tomar para si como mulher a esposa de Abraão, Deus interveio. Então, o próprio rei tornou-se um instrumento divino para deportar o patriarca de volta para Canaã com todos os bens adquiridos com o favorecimento do governante egípcio.

Curiosamente, apesar de Abraão ter sido conduzido pela circunstância da fome e ainda sentido medo de morrer assassinado pelos egípcios, Paulo identifica-o como o pai daqueles que têm fé na sua epístola aos Gálatas. E, em momento algum, o fato de ter migrado para o Egito ou de ocultar por duas vezes a sua condição matrimonial com Sara, fez com que Abraão fosse excluído do rol dos heróis da fé. Em Hebreus, somente os seus atos positivos são mencionados, mostrando que Deus não leva em consideração as falhas humanas para fins de justificação perante Ele.

Ora, Deus não chamou homens perfeitos para realizarem a sua obra na terra. Abraão e Pedro, assim como nós, foram homens sujeitos às mesmas dificuldades que enfrentamos no nosso cotidiano. E, observar que as crônicas da Bíblia não escondem as falhas de seus personagens, mostra-nos a grandiosidade da graça de Deus, de maneira que também somos capazes de decidir ser como eles – santos de carne e osso.

Na sua epístola universal, Tiago, após ensinar que a fé sem obras é morta (2:14-26), termina falando sobre um dos principais profetas de Israel nos últimos da carta, dizendo que “Elias era homem semelhante a nós, sujeito aos mesmos sentimentos” (5:17). E, quando me lembro de Elias, não posso me esquecer da ocasião em que, depois de enfrentar os 400 profetas de Baal, ele também fugiu para uma caverna no Horebe (no Monte Sinai).

Todos esses fortes exemplos nos mostram o quanto devemos compreender também a nossa frágil humanidade, prosseguindo na caminhada em direção à Canaã espiritual, mesmo quando enfrentamos lutas ou falhamos.

Deus quer contar conosco para fazermos a sua grande obra na terra. Se, por acaso, viermos a ter falta de fé e começarmos a submergir nas águas, Jesus está aí para nos dar a mão, colocando-nos de volta ao barco. Se entramos numa furada como aconteceu com o patriarca Abraão em sua peregrinação no Egito, Deus pode nos livrar da situação, mesmo que sejamos deportados do mundo para a graça de Cristo. Enfim, basta que tenhamos um pingo de fé do tamanho de um grão de mostarda.

2 comentários:

  1. Vim conhecer seu blog e estou te seguindo, depois de uma passadinha para conhecer o meu.
    Uma boa Semana.

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  2. Olá! Seja bem vindo ao meu blog! E aproveito para dizer que também entrei no seu site. Um abraço!

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